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CAMPO & CIDADE

Sapecada de Pinhão

Eis que Santa Catarina se destaca. Seis mil toneladas de pinhão. Expectativa de boa safra, portanto. Tudo pronto para a vigésima segunda edição da Festa do Pinhão em terras lageanas. Entrevero à vista, como gastronomia, é claro. Sobre a Araucária angustifolia, boas histórias; senão vejamos.

Os índios cultuavam-nas. Algo sagrado. Nada além do pinhão. Junto com a gralha-azul, disseminavam-na por canhadas, vertentes e espigões. E assim as famosas matas de araucárias, gradativamente, foram cobrindo vastos territórios. E com as araucárias, a erva mate. Caprichos da mãe-natureza.

Uma curiosidade: emprestou toponimidades sertão afora. Curitiba, por exemplo: provém de raiz tupi Kury yt yba - muitos pinheiros.
Pinheiral. E outras localidades seguiram as pegadas: Curitibanos, São José dos Pinhais Araucária, Pinhais. E há outros pinheiros espalhados por aí, inclusive na paulisteia desvairada.

Conhecido também como pinheiro-do-Paraná, pinheiro-brasileiro, pinheiro-branco, pinheiro-chorão, pinheiro-elegante, caiová, curiová, pinheiro-das-missões.

Linguajares campeiros à parte, falar de pinhão é falar de uma espécie chave profundamente associada à fauna silvestre. Majestosa e
imponente, gradativamente, a araucária – taça erguida aos céus -, se sobrepõe no dossel florestal. Benção da natureza. Elixir à vida.

Findo o ciclo madeireiro que praticamente a dizimou, eis que um novo ciclo se apresenta: o aproveitamento do fruto. E nesse sentido
pesquisas recentes da Universidade Federal do Paraná, inovam. A pratica da enxertia antecipa a produção. De menor porte, facilita a colheita das pinhas. É a ciência a serviço do homem.

E o nó de pinho, então. Denso e resinado. Não há nada igual para se aquecer no frio inverno, ou para a produção de belas peças artesanais.
Recentemente chamou a atenção dos ornitólogos a presença do papagaio-de-peito-roxo. Migram à caça de frutos. Bandos refestelam-se
nos pinheirais. Solfejam. É dessas maravilhas da mãe-natureza, digna de originalidades.

Mas, mal comparando, nada igual a uma boa sapecada de pinhão. Sim sapecada de pinhão. Descrevê-la, ó quanta ousadia! Esquecê-la, no
entanto, nunca.

Manhã de inverno. Descampado. Frio de rachar os ossos. Tio Generino debulha uma pinha. Embora menino, não resisto. Boto a mão na massa. Outros enturmam. E vem as grimpas. Recolhê-las no campo, todo o cuidado, pois, ao menor descuido transfixam a pele. Mãos e pés, as partes mais sensíveis. Pontiagudas, feriam. Dor de fechar os olhos. Nada, no entanto, deteve a empreitada; amontoá-las. Tudo pronto. Momento de pôr fogo. Isqueiro à mão, ritual para Generino. Faíscas. A chama ergueu-se sobranceira. Labaredas linguarudas. A energia ali armazenada, enfim se desprende. Ouvem-se apenas estalidos, e a fumaça esbranquiçada a enovelar-se no céu. Calorzinho providencial. Mãos empalmadas, adeus a friagem. Todos vibravam. Superada a refrega, sob cinzas e brasas, lá estavam os pinhões, tostados pinhões. Que festa! Sopra daqui, sopra dali, até o ponto certo para saboreá-los.

E, por fim, o memorável refrão: “Pinheiro me dá uma pinha/pinha me dá um pinhão,/menina me dá um abraço/que te dou meu coração. Não sei porque, mas o tio Generino adorava essa cantiga.

 
Joinville, 20 de abril de 2024

Onévio Zabot
Engenheiro Agrônomo

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